quarta-feira, 17 de junho de 2009

MEMORIAL

CENTRO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES DA UNB PROGRAMA GESTÃO DA APRENDIZAGEM ESCOLAR PDE / GESTAR II – LINGUA PORTUGUESA – PIAUÍ FORMADORA: Maria Trindade Ferreira dos Santos
Meus pais moravam na zona rural. Aos sete anos de idade me encaminharam à escola que ficava a cinco quilômetros da localidade onde morávamos. Fazia o percurso a pé , diariamente de ida e volta acompanhada de cinco irmãos mais velhos. Lá a professora me ensinava ler o alfabeto naquelas letras grandes e escuras da carta de ABC. Com ela aprendi a ler, soletrando cada letra, sílaba e palavras contidas na carta. Em casa, após o jantar à luz da lamparina, lia para meus pais o que havia aprendido naquele dia e eles se empolgavam contando para os vizinhos do meu desempenho escolar. Nenhum dos dois eram escolarizados, mas tinham um desejo muito grande de ver os filhos lendo e escrevendo. Queriam os filhos “formados”. Construíram casa na cidade para os filhos poderem continuar os estudos, e foi na escolinha que ficava nos fundos de casa , que tive meu primeiro contato com livros. No primeiro ano “B”, por apresentar um nível de alfabetização bem desenvolvido, ganhei da professora , de presente, um livro de Português que tinha um texto , cujo título era: O Pato Pateta. A ilustração do texto era um pato amarelo e ao lado a figura de um poço com uma corda amarrada em uma lata, parecido aquele poço que apanhava água todos os dias para os afazeres de casa. Sem a ajuda, consegui ler a lição para a professora, que vislumbrada me encheu de elogios diante dos colegas. Inclusive alguns apresentavam grandes dificuldades em reconhecer uma letra ou sílaba. Depois com minha irmã mais velha descobri que o texto era uma música. Aprendi cantá-la e até hoje canto pra meus alunos. Lembro-me que a capa do livro era lilás e tinha uma linda flor em forma de bacia e a figura de um casal de crianças sentadas sobre ela, como se estivessem flutuando nas águas de um rio. Era uma Vitória – Régia. O nome da flor era o mesmo do livro. E o que mais me chamou a atenção foi quando a professora falou para a turma que aquela flor realmente existia, era aquática, enorme, o tamanho parecia um barco por isso as crianças estavam sentadas ali, encima. E eu que nem sabia o que significava aquática, fiquei impressionada. Lembro-me ainda da professora quando falou que só existe no rio Amazonas. Na 5ª série, vivi uma experiência marcante que reflete até hoje na minha vida. A Professora de Ciências, após expôr um tema, dividiu a turma em grupos de estudo atribuindo a cada um, o assunto a ser estudado e apresentado para turma – um tipo seminário – onde um dos membros deveria ser sorteado no momento da apresentação. O assunto era :”Doença de Chagas”. Confesso que tremia e gelava as mãos só de imaginar que poderia ser sorteada para aquela aula. Mas não tinha como fugir do destino, acabou sendo eu mesmo. Tímida, mas segura de si, pois havia lido tanto aquele texto para decorar que terminei compreendendo. E com um cartaz em mãos, fui lá na frente, conforme solicitara a professora, e dei uma aula “espetacular”. Mesmo sem saber o que a professora e os colegas estavam achando. Como não era comum na época essa prática do aluno se expressar em sala de aula, no final, os colegas estavam todos abismados. A professora me parabenizou com o seguinte comentário:” um dia você ainda será uma grande professora, provou que tem talento”,comentou sobre mim nas outras turmas e na direção da escola. A partir daí, fiquei conhecida de todos e passei a receber convites da escola para representa - lá em várias situações nas datas festivas, lendo discursos, poemas, falando em público etc.... Assim, nasceu um sonho, o de tornar-me professora. Aquela experiência é especial para mim, até hoje, pela oportunidade de um sonho possível, com perspectivas de um futuro promissor, fator fundamental na vida do ser humano, principalmente do jovem. Tempos difíceis, que até os livros didáticos os pais tinham que comprar. Os meus não tinham condições financeiras por isso não comprava, estudava pegando emprestado ou indo pra casa da colega estudar com ela. Perdi a conta das vezes que fiquei fora da sala de aula ou voltei do portão da escola por não ter comprado o livro de português para dar a lição. Os programas do governo, PNLD não existia no período, biblioteca?... se existia na escola não era do conhecimento dos alunos, não me recordo de nenhum incentivo para estimular o hábito da leitura, só mesmo os textos, as lições que tínhamos que decorar. Mas de repente... na escola havia algumas salas que as portas permaneciam sempre fechadas. Se bem que eu tinha a maior curiosidade em saber o que tinha dentro daquelas salas, mas nunca tive essa oportunidade. Se era uma biblioteca, até o nome era complicado pronunciar, não era comum no vocabulário dos alunos, nem da maioria dos professores da escola. B I B L I O T E C A? Não fazia parte do cotidiano escolar. Com o passar dos anos, trabalhando durante o dia e cursando o Ensino Médio (curso normal) a noite, foi uma fase conturbada na minha vida, somente a vontade de vencer, a motivação de alguns colegas da sala de aula e a professora de Literatura me fazia forte e perseverar no sonho de sair daquela escola, normal, “formada” como meus pais almejavam e “professora”o que realmente eu buscava. O cansaço quase sempre me vencia , o patrão não tinha dó, já era normal chegar atrasada para a primeira aula, mais lá estava a professora ,sensibilizada, orientando sobre a aula, com o texto trabalhado em mãos atendendo-me na sala dos professores. Era professora e amiga, com ela aprendí a gostar de redigir mesmo sem saber. Me emprestava livros, para ler, quase sempre de Literatura. Poemas encantadores, ah!.....que bom! Mas só conseguia ler no trabalho, escondido do chefe, é claro! Não tinha tempo. Que chato! Sempre gostei de Literatura Brasileira, do Barroco e o Modernismo, principalmente, pelos grandes nomes que se destacaram no período. Pelas belíssimas obras existentes. A minha primeira tentativa frustrada de vestibular foi pra Letras/Português. Depois cursei uma graduação na área , concluir e não conseguir ser diplomada, foi mais uma tentativa frustrada. A Instituição e o curso não eram reconhecidos pelo MEC. Mas valeu sim, a pena. Porque aprendi muito. Hoje sou graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual do Piauí e cursando uma pós-graduação, em Supervisão escolar, estou feliz. . No meu período de normalista me divertia muito nas aulas de estágio da disciplina Prática de Ensino.. Pra mim sempre foi uma terapia o que me fez ficar fascinada pela sala de aula, apesar de não gostar muito das aulas de Estrutura e Funcionamento do Ensino Brasileiro. Também pudera ... com um professor desajustado daquele, só hoje entendo, o motivo de não gostar e a importância que tem para o professor. Até já ministrei a disciplina em universidade. Destaquei-me no curso enquanto aluna por conhecer um pouco sobre a legislação educacional brasileira. Digo, um pouco, por que ninguém mais é seguro dos conhecimentos que possui, as inovações acontecem rapidamente, a velocidade das informações é espantosa, em relação ao grau de conhecimento que se tem. Para isso fomos alertados pelos nossos experientes professores em tempo de universidade:”Busquem, não desistam, o ser humano é insaciável, adotem isso pra vida de vocês, e extrapolarás todas as barreiras do acaso”. (prof. de Didática) nas suas aulas dinâmicas que mais pareciam seminários para elevar a autoestima. A cada aula saia dali com mais vontade de viver e vencer na vida, e olha, que meus anos de universidade foram sofridos, estudando distante de casa, em outra cidade, com criança, casa, trabalho e esposo para dar à atenção devida. Por isso minha trajetória no ensino superior não poderia deixar de marcar minha vida, porque considero um salto para meu desenvolvimento pessoal e profissional.Contudo, considero positivo, conseguir vencer várias barreiras, inclusive a de sentir muito sono na hora de ler, ou ler apenas textos ilustrados, imagina!... Gosto de ler livros, textos de qualquer gênero desde que esteja motivada. Preciso apenas acelerar um pouco mais o ritmo da leitura para que esta não se torne cansativa. E sim prazerosa, como tem sido a realização do meu sonho de ser uma professora “Formada” e agora "formadora" do GESTAR II. Isso é espetacular!Antonio Almeida (Pi), janeiro/2009


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